27- Lágrima palhaça

Não pense o leitor que aqui é o próprio autor quem explica seu livro. Embora coincidam os nomes na capa e na assinatura desta nota, somos outros um do outro. O que ora escreve e recria os poemas não é o mesmo que aos 17 anos criou Lágrima palhaça. Naquela época talvez duvidasse mais de si mesmo do que seja capaz de desconfiar hoje dos moleques de 17. Com o cinza dos cabelos veio certa condescendência. Se isso fosse algum sintoma do que chamam sabedoria e como o moleque já se achasse velho desde então, seria sinal de que só me falta ficar chinês.

Os originais, primeira tentativa de dar unidade a um livro de poemas, estavam esquecidos numa encadernação de espiral com desenho a lápis na capa. O que os trouxe à tona foi mais a lembrança dos tempos que não voltam mais do que a vontade de revisitar os primórdios da minha relação com a escrita. Mas uma coisa leva à outra e a memória se abisma. Leminski dizia que aos 17 todo mundo é poeta – o difícil era continuar sendo aos 30, 40, 50. Guardei na gaveta o poeta que fui. Agora, mais certo das dificuldades de continuar sendo, roubo-lhe o estro e publico-me.

Decidimos, eu e ele, manter sem alterações somente o primeiro poema. Espécie de janela para o substrato, para a camada mais antiga de nossa poesia. Quanto aos demais, não seria correto dizer que os alterei nem reescrevi. Submeti-os a um processo de laminação, fui sobrepondo camadas de silêncio, e permaneceram apenas alguns sons, ou imagens ou frases. Porém mantivemos o sentido fundamental da leitura, a visão de mundo que o moleque propunha.

Paralelamente a esta edição, o leitor encontrará uma versão digital com o fac-símile dos originais no site www.textoterritorio.pro.br/lagrimapalhaca

Alexandre (Graça) Faria

Esta é a “nota prévia” da plaquete Lágrima palhaça, editada 2012, por Laura Assis, ex-aluna da Faculdade de Letras, que na época se aventurava com a “Aquela Editora”. Ter tido poemas pela primeira vez editados por uma aluna faz um sentido especial para mim, especialmente na trajetória acadêmica e de professor que tentei mapear alguns capítulos acima. Sinal dos tempos, sinal de que eu ainda era capaz de embarcar na onda.

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